Não se trata do meu hábito escrever textos fora da temática da educação,
assim o fiz para manifestar o meu profundo descontentamento relativamente a um
fenómeno que tem vindo a manchar a reputação de muitos estudantes
universitários. De boca cheia, se têm intitulado doutores. Acham-se “bons”
demais ao ponto de aderir convites que não lhes dizem respeito, convites que
lhes “obrigam” a falar em público sobre matéria que não sejam do seu interesse.
Todo fenómeno não controlado pode trazer efeitos graves na vida de alguém.
Em um dos canais televisivos, na manhã de hoje, debatia-se o seguinte tema: Nível escolar dos pais e o sucesso
escolar dos filhos. À medida
que o tempo ia passando, os convidados traziam abordagens resultantes das
experiências pessoais e não abordagens que reflectem o efeito de algumas
pesquisas feitas acerca do tema do dia.
Uma das convidadas do painel, por sinal, estudante da Faculdade de Letras e
Ciências Sociais na Universidade Eduardo Mondlane referiu que, passo a citar:
os meus pais, sempre acompanharam o meu sucesso escolar, sempre me incentivam a
estudar para no futuro não ficar na rua a vender.
Ora vejamos, esse tipo de declarações dada à nível da televisão suscita
muitas inquietações e rumores. Sem dúvida, os espectadores e telespectadores
atentos esperavam ouvir comentários e/ou respostas das questões como: Até que
ponto o nível escolar de um pai pode influenciar o sucesso escolar dos seus
filhos? De que maneira um pai escolarizado e não escolarizado pode contribuir
no sucesso escolar dos filhos? E por fim, que tipo de benefícios/vantagens os
filhos podem obter num pai escolarizado?
Elísio Macamo, sociólogo moçambicano, numa palestra proferida no espaço
1502 da UEM, disse que o estudante do nível superior devia saber honrar a sua
formação. Honrar a formação académica tem várias e inúmeras interpretações.
Pode estar relacionada com o que Jecks Dellors (2012), num dos seus quatros
pilares da educação em recomendação da Unesco chamou de o saber ser e
estar, que no meu entender é falar para dizer algo útil e relevante
para o auditório que o escuta. Pode também significar, acima de tudo, a
convicção de que o que o indivíduo se propõe a dizer não vai deturpar a
informação que um dia teria sido divulgada, tal como fazem os verdadeiros e
fiéis académicos, que constantemente falam certo para pessoas certas no lugar e
momento certo, transmitindo um conhecimento lógico.
Voltando ao caso da moça que os pais permanentemente acompanhavam o seu
sucesso escolar na medida em que lhe encorajavam a estudar sob pena de um dia
ficar na rua a vender. A questão que se pode colocar é a seguinte:
Quando alguém fica na rua a vender é resultado de não ter estudado? Ou por
outras, todo o indivíduo que vende na rua é porque não estudou? Qual é a
relação lógica entre o vender na rua e o não ter estudado?
No meu entender, à semelhança de qualquer pai, usa-se esse tipo “truque”
para se incutir na mente das crianças sobre a importância da educação. Porém, a
moça, sendo estudante do ensino superior, penso que devia trazer uma abordagem
que, à partida, não levante inquietações e nem especulações.
Infelizmente, em Moçambique, já aparecem os graduados do nível básico,
médio e até do superior a procurar as melhores condições de auto-sustento na
rua, no mercado e nas lojas da cidade devido a falta de um emprego condigno.
Portanto, o maior erro que alguém pode cometer na vida é assumir que todo
vendedor, principalmente, da rua, é um indivíduo iletrado e ignorante.
Daqui há sensivelmente duas semanas, vem aí os exames de admissão, como
sempre, gente com coragem e vontade de prosseguir com a carreira estudantil
será uma vez mais adiada sob alegações de que não há vagas para todos, que
entre o melhor.
Aos colegas-estudantes, vai um apelo para vós, não sejais espalhados e nem
papagaios. Saibam recusar o convite que não vos diz respeito, não falem antes
de dar atenção à quem detém de algum conhecimento sobre o assunto abordado, e
por fim, não falem para aparecer mas sim para ajudar a mudar a personalidade
das pessoas que vos rodeiam e que depositam confiança em vós.
Um docente meu disse que costumava pedir ajuda aos colegas de profissão e
confiança para dar aulas acerca da matéria que ainda não seja do seu domínio. Este
tipo de atitude, embora seja boa, no seio do departamento causava uma certa
desconfiança quanto ao saber do docente. Entretanto, devia servir de lição
positiva, pois, permite com que o docente não passe por uma vergonha
desnecessária. Paulo Freire, na obra da pedagogia de autonomia diz que o
professor é um eterno aprendiz, significa que deve aprender com os outros
sempre que for necessário.